Batendo um papo sobre alfabetização...



Oi gente.
No mês de julho a gente conversou basicamente sobre a Educação Infantil e a teoria de Jean Piaget, mas antes de entrar no estudo do Ensino Fundamental achei interessante fazer um estudo sobre a transição entre eles, principalmente a etapa da alfabetização!

A primeira providência foi revisitar a Dona Emília Ferreiro. 
Acho impossível alguém da área, mesmo que estudante, não conhecer as obras e a história da Emília Ferreiro, mas caso aconteça corre aqui para resolver esse problemão!
Como já comentei, além de fazer uma ligação entre as etapas Ed. Infantil e Alfabetização, a Emilia Ferreiro também será uma ótima transição do Jean Piaget que estudamos já estudamos, uma vez que ela estudou e trabalhou com o próprio, e as descobertas de ambos revolucionaram o campo da aprendizagem!

O livro "Psicogênese da Língua Escrita", famosa obra de Emília, é obrigatório na biblioteca de qualquer professor alfabetizador, mas a obra que eu usei como fonte para este texto do blog foi o "Com todas as letras", um livro fininho de apenas 102 páginas, que dá para ler em uma sentada no sofá, e nele temos três textos sobre o novo olhar da alfabetização. Fase esta que deve ser entendida do ponto de vista de quem é alfabetizado e não de quem alfabetiza. Um momento que deve ser social e não apenas escolar.

Vamos explicar este conceito:
Em 1990 foi inaugurado o "Ano da alfabetização na América Latina". 
Órgãos internacionais como a Unesco e a Unicef, com o investimento do Banco Mundial, decidiram investir na Educação Básica, principalmente porque a década de 80 foi bastante improdutiva nesta questão. Colocar todas as crianças na escola com tamanho crescimento populacional era um desafio e tanto! Só para vocês terem uma ideia em 1965 o Brasil tinha 5 milhões de alunos no primeiro grau, enquanto que em 1983 já eram 23 milhões! Como dar conta de tudo isso?

Por mais que várias escolas novas tivessem sido inauguradas, as classes ainda eram superlotadas, com um número pequeno de professores, afinal, o salário já era ruim. Com isso a faixa de repetência logo nas primeiras séries era muito alta, pois quem não conseguia se alfabetizar acabava ficando para trás. O fracasso escolar era um fato social!
E financeiramente a repetência é muito ruim, pois duplica os gastos com o mesmo aluno! Então o que fazer?
 
A primeira medida foi criar serviços de atendimento especializados para as crianças com dificuldades, o que foi favorável pois além de diminuir o número de alunos em classe, desafogando o trabalho do professor, ela também criava outros postos de emprego para psicólogos, terapeutas e auxiliares. Porém, além de igualar crianças com dificuldades àquelas que realmente tinham uma deficiência, surgiu a dificuldade financeira: Este tipo de atendimento especializado encarece muito o custo de cada aluno, e países empobrecidos e endividados, como o nosso, não teriam como arcar com este atendimento.

Colocar todos os alunos na escola, ampliando o serviço educativo a todos, infelizmente, acabou por baixar a qualidade da alfabetização. Que passou a ser cobrada apenas como uma técnica rudimentar de decodificar textos, um objeto puramente escolar, um aprendizado que servia para "passar de ano", o que acabou gerando uma falha na compreensão da função da escrita na sociedade.    

No livro, Emília Ferreiro nos expõe constantemente aos reais objetivos da aprendizagem da leitura e escrita e como as crianças devem compreender essas funções em seu período de alfabetização.
A escrita é um objeto social que serve para transmitir informações (como escrever um recado a alguém), buscar e pesquisar algo (como por exemplo uma receita culinária), e até mesmo aliviar a memória (como uma lista e compras no supermercado).
As crianças que recebem estes estímulos familiares no cotidiano estão propensas a entender a utilidade da informação, porém várias experiências já comprovaram que mesmo as crianças marginalizadas, sem este estímulo familiar, conseguem ser alfabetizadas com qualidade quando compreendem a função social da leitura e da escrita.  

"A escrita é importante na escola porque é importante fora da escola, e não o contrário" 
Emilia Ferreiro.
  

Ao alfabetizar, o professor deve ter em mente alguns pontos:
A criança deve compreender que o sistema alfabético da escrita é uma representação da nossa linguagem;
A escrita tem uma função social, que vai muito além da escola, e qualquer objeto pode ser portador de escrita, como por exemplo revistas, embalagens, etc..;
A leitura vai além de unir símbolos, ela precisa ser feita com compreensão, para isso deve-se enfatizar também a leitura silenciosa e não somente a oralidade;
É necessário ensinar as crianças a produzirem textos;
A criança deve ser estimulada a ter curiosidade sobre a escrita e não medo.

Emília Ferreiro afirma que as crianças são facilmente alfabetizadas a partir do momento que descobre o contexto social da escrita, pois possuem uma curiosidade natural aos objetos interessantes que as cercam. Porém, os professores dificultaram este processo, ensinando através de uma progressão cumulativa imaginada, definindo as letras "fáceis" e a "difíceis", estigmatizando o que deveria ser uma experiência natural e alegre em um trauma para muitas crianças.
É sabido que as crianças aprendem mais construindo seu saber do que repetindo, e os processos de alfabetização regrados e baseados em repetição maçante de leitura e escrita transformaram a alfabetização e algo mecânico e chato.

No livro, a autora explicita a importância da produção de materiais para facilitar as ações da alfabetização. Mas não são "cartilhas" ou "manuais" para se ensinar a ler, e sim materiais para ler de fato, livros adequados a faixa etária, de assuntos interessantes.
Também são necessários materiais para os professores, para que compreendam a prática pedagógica, e não com uma receita sobre a alfabetização, afinal, cada classe é única, então não há uma "fórmula alfabetizadora" que possa ser usada em todas as classes.
Materiais para alfabetizar, na lógica construtivista, chegam a ser contraproducentes. Cartilhas são inferiores a tudo que a nossa língua já possui, como por exemplo músicas, parlendas, poemas, fábulas, etc... Então porque usá-las no lugar do que já temos com tanta qualidade?

As pesquisas da Emília Ferreiro trabalhavam diretamente com crianças de 4 a 6 anos, o que chamamos muitas vezes de pré-escolar. Uma fase que vive em uma eterna dicotomia nas escolas, entre instituições que possuem o objetivo de alfabetizar na pré-escola e outras que tentam a todo o custo evitar a alfabetização nesta fase. Então a perguntarmos para a autora, qual o correto, deve-se ler e escrever na pré-escola ou não? A resposta é certeira: Não se deve ensinar, porém não se deve impedir que a criança aprenda. Porque por mais que o objetivo não seja a alfabetização, ela acontecerá de forma natural pelo próprio interesse da criança.

A partir da obra da "Psicogênese da Língua Escrita", redação em conjunto com a escritora e psicóloga Ana Teberosky, Emília Ferreiro desenvolveu várias experiências alternativas para a alfabetização e elaborou propostas fundamentais para um processo de alfabetização com qualidade.

1. Retoma a língua escrita ao seu caráter de objeto social;
2. Aceitar que todos os alunos (até na pré-escola) podem produzir e interpretar a escrita, cada qual em seu nível;
3. Estimular as crianças na interação com a língua escrita em vários contextos;
4. Permitir às crianças o acesso, o quanto antes, da escrita de seu nome próprio;
5. Não supervalorizar a criança que compreende a relação da linguagem com a escrita, ou subvalorizar a que não compreende ainda;
6. Não corrigir imediatamente a grafia ou ortografia da criança.

Segundo Ferreiro há uma consciência crescente sobre a importância de uma alfabetização de qualidade, principalmente nos países mais pobres como o Brasil. Não há como aceitar as altas taxas de repetência que geram mais desigualdades sociais, mas ao mesmo tempo não se pode enxergar a escola apenas como uma instituição social, afinal, a função da escola é gerar aprendizagem!
A solução é uma nova visão sobre a alfabetização, que contribuirá para a compreensão, difusão e enriquecimento da nossa própria história.

Beijos, M.





 

Vídeo: Pensadores na Educação: Emília Ferreiro e as práticas de alfabetização
Vídeo: Nova Escola | Emilia Ferreiro | Leitura e escrita na Educação Infantil
 

🔑 Espero que tenha gostado do conteúdo.
Para escrever este texto consultei diversas fontes: Google, Wikipedia, Revista Nova Escola e Canal do Instituto Claro. A chave do sucesso é consultar outras fontes você também!


Bibliografia
FERREIRO, Emília. Com todas as letras. São Paulo: Editora Cortez, 1996.